Risco de demência é maior para negros, diz estudo britânico
Folha de São Paulo - Uma pesquisa feita com dados de 295 mil pessoas no Reino Unido apontou para um maior risco de desenvolver demência em pessoas negras do que nas brancas ou asiáticas.
O risco associado para doença neurodegenerativa em indivíduos com mais de 55 anos era de 34% a 43% maior em negros em comparação aos brancos. O mesmo risco não foi encontrado para outras etnias avaliadas, como asiáticos.
Os resultados foram publicados na edição desta quarta-feira (12) da revista científica PLoS One. A pesquisa foi desenvolvida por cientistas da Divisão de Psiquiatria da Universidade College de Londres e do Fundo Camden e Islington do Serviço Nacional de Saúde britânico.
Para avaliar o risco associado ao desenvolvimento de demência, os cientistas analisaram dados de 294.162 participantes de 40 a 69 anos cujas informações estavam inseridas no chamado biobanco do Reino Unido de 2006 a 2010. Essas informações incluíam etnia, escolaridade, idade, gênero, prática de atividade física, condições prévias de saúde (diabetes, hipertensão, obesidade, perda auditiva etc.), consumo de álcool, cigarro e exposição à poluição do ar.
Os cientistas também coletaram amostras de sangue dos participantes para traçar a presença de biomarcadores já conhecidos para demência que podem estar associados ao maior ou menor risco de aparecimento da doença. O peso e o índice de massa corporal também foram anotados individualmente.
Para a avaliação do risco, os pesquisadores selecionaram apenas os indivíduos com 55 anos ou mais no momento de início do estudo, pois nas pessoas mais jovens o risco é baixo. Os fatores idade, gênero e sociodemográficos foram ajustados para todos os participantes.
No período analisado, 5.972 pacientes desenvolveram demência (2,03%), sendo 5.789 brancos, 79 asiáticos e 91 negros. A chamada razão de risco (HR em inglês) nos participantes que se autodeclararam negros era de 1.43 (intervalo de confiança de 95%), enquanto nos participantes que se autodeclararam asiáticos era de 1.09 (com intervalo de confiança 95%). O grupo controle para o estudo era ter se autodeclarado branco, pois essa era a população em que o HR era igual a 1.
Quando ajustados os dados para todos os fatores de risco, incluindo escolaridade, predisposição genética e condições prévias de saúde, o risco na população negra ainda era maior do que na população autodeclarada branca, com HR igual 1.34 (intervalo de confiança 95%).
A pesquisa ainda encontrou uma forte correlação entre escolaridade e risco de desenvolver demência, com o menor risco quanto mais alta a escolaridade do grupo analisado, e também maior risco para pessoas com taxas mais altas de obesidade, diabetes, perda auditiva ou hipertensão.
Porém, na população branca, o que mais influenciou o risco de desenvolver demência foi o tabagismo (HR=1.23, comparado a 1.03 nos negros e 0.9 nos asiáticos). A análise não encontrou como fator de risco para demência nos negros o consumo moderado a alto de álcool (equivalente a igual ou menos de 21 doses por semana), mas o fato de esse consumo ser maior na população branca pode ter influenciado esse resultado.
Para Naaheed Mukadam, psiquiatra e pesquisadora da Universidade College em Londres e primeira autora do estudo, esse resultado é concordante com pesquisas feitas em outros países, que apontaram que hábitos de vida como consumo de cigarro e álcool estão mais associados ao risco de demência em pessoas de etnias brancas, enquanto doenças crônicas estão mais associadas às populações negras e de maior vulnerabilidade social.
"A população negra no nosso estudo tinha taxas muito baixas de tabagismo e consumo excessivo de álcool. Por outro lado, as taxas de diabetes, obesidade e hipertensão eram maiores neste grupo comparado com a população branca. Mesmo ajustando para esses fatores, os negros ainda tinham maior risco para demência, o que indica que esse risco elevado não é explicado somente pela alta incidência desses fatores", explica.
Segundo Mukadam, outro fator que pode influenciar tal risco para os negros é a frequência elevada de um gene considerado como um marcador de demência, que apareceu mais na população negra estudada do que nos brancos.
"Não sabemos por que esse alelo é mais comum nesse grupo específico da população negra comparado aos asiáticos e brancos. Se a frequência desse mesmo gene se distribui de maneira diferente em outras populações negras, ou até mesmo na população geral, vamos precisar de mais estudos para saber", diz.
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Fonte: Folha de São Paulo
Imagem: Ernesto Benavides/AFP