No Palavra Aberta, estratégias para favorecer a saúde mental do paciente Internado e consciente na UTI

por Antônio Luiz Moreira Bezerra publicado 18/12/2024 16h18, última modificação 18/12/2024 16h18
O médico intensivista José Noronha é o convidado do programa

O ambiente da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é um dos mais desafiadores tanto para pacientes quanto para seus familiares. Muitas vezes, esse espaço é associado ao risco iminente de morte, especialmente após a pandemia, quando a percepção popular da UTI foi moldada pela urgência e gravidade dos casos tratados. No entanto, o médico intensivista José Noronha, convidado do programa Palavra Aberta da TV Assembleia, com parceria da Universidade Federal do Piauí, esclareceu que, ao contrário da imagem de um ambiente voltado para a morte, a UTI existe para reverter riscos e possibilitar a recuperação dos pacientes.

 

O impacto psicológico da UTI no paciente consciente

 

A UTI é destinada a pacientes com disfunção orgânica grave, seja por acidentes, complicações de saúde ou doenças críticas. Muitos desses pacientes estão conscientes, mas em um estado vulnerável, o que pode gerar sérios impactos emocionais. De acordo com o Dr. José Noronha, a falta de autonomia, o confinamento, a ansiedade e até mesmo a sensação de solidão são comuns entre os internados. A experiência de estar em um ambiente impessoal, com pouca interação humana e marcado por barulhos constantes, pode intensificar esses sentimentos.

 

A sensação de desamparo e o medo da morte

 

A internação em UTI pode gerar no paciente uma sensação de desamparo, medo e até pânico diante da morte iminente. A impossibilidade de ter os familiares por perto, somada à falta de familiaridade com os profissionais que utilizam trajes específicos, contribui para o aumento da ansiedade. Além disso, a arquitetura da UTI, com suas poucas janelas e iluminação artificial, pode desorientar o paciente, que perde a noção do tempo e do espaço.

 

O Dr. Noronha destaca que a experiência na UTI é caracterizada por invasões constantes no corpo do paciente, como o uso de sondas e ventilação mecânica. Isso, somado à sensação de estar em um lugar "não acolhedor", pode causar grandes níveis de estresse, ansiedade e até mesmo distúrbios neurológicos, como o delírio – uma desorganização mental que resulta em confusão e perda de raciocínio.

 

O papel da equipe multidisciplinar e das estratégias de suporte psicológico

 

Para lidar com esses desafios emocionais, a equipe de UTI é composta por profissionais de diversas áreas, incluindo médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas. O cuidado integral e a vigilância constante são fundamentais para a recuperação física do paciente, mas o suporte emocional também desempenha um papel crucial na sua saúde mental.

 

O Dr. Noronha enfatiza a importância da intervenção psicológica e do acompanhamento psiquiátrico para minimizar os efeitos do estresse e da ansiedade. Estratégias simples, mas eficazes, como a introdução de um calendário, o uso de relógios e a possibilidade de contato com a família, podem melhorar a sensação de bem-estar do paciente e reduzir o impacto psicológico da internação. "A interação com a família e o fornecimento de itens pessoais que conectem o paciente com seu cotidiano podem contribuir significativamente para o seu conforto", explica o médico.

 

O desafio do acompanhamento familiar

 

Durante a pandemia, muitos pacientes permaneceram sedados, o que limitou a presença de familiares nas UTIs. Porém, conforme os pacientes se recuperam e estão conscientes, a presença da família torna-se essencial para o processo de cura emocional. O Dr. Noronha ressalta que a participação do familiar deve ser cuidadosa, considerando o perfil de cada pessoa. "É fundamental que o familiar compreenda a gravidade da situação e seja capaz de proporcionar conforto sem aumentar a ansiedade do paciente", afirma.

 

Em algumas UTIs humanizadas, a presença dos familiares por até 24 horas foi liberada, o que tem mostrado resultados positivos na recuperação emocional dos pacientes. A experiência de um cuidado mais próximo, com a presença dos entes queridos, traz uma sensação de apoio e segurança, reduzindo a tensão e o estresse.

 

Estruturas e práticas para melhorar o ambiente da UTI

 

Além do apoio psicológico e familiar, a modernização das UTIs também tem se mostrado essencial para melhorar a experiência do paciente. Ambientes com quartos privativos, janelas amplas, iluminação natural e até jardins internos podem proporcionar um ambiente menos claustrofóbico e mais acolhedor. Essas melhorias estruturais contribuem para reduzir o impacto negativo do ambiente hospitalar sobre a saúde mental do paciente, tornando sua estadia, embora nunca confortável, mais suportável.

 

O cuidado na UTI vai além dos tratamentos médicos e intervencionistas. A saúde mental do paciente deve ser considerada uma parte fundamental do processo de recuperação. A equipe multidisciplinar, o apoio psicológico e a presença da família têm um papel essencial em minimizar o impacto emocional da internação e oferecer ao paciente um ambiente mais humano e acolhedor, com menos ansiedade e mais esperança. A UTI, ao contrário do que muitos pensam, é um local de luta pela vida, onde cada detalhe, cada gesto, pode fazer a diferença na recuperação integral do paciente.

 

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Fonte: TV Assembleia