Impactos da hipersexualização dos corpos negros no ambiente digital

por Antônio Luiz Moreira Bezerra publicado 28/10/2024 16h15, última modificação 28/10/2024 17h20
No Palavra Aberta, o pesquisador Luze Silva lança um olhar sobre a desumanização e o preconceito estrutural

A hipersexualização dos corpos negros no ambiente digital é uma questão que evidencia os impactos de um preconceito enraizado na sociedade. Este fenômeno ocorre, por exemplo, quando corpos negros, especialmente o de homens gays, são objetificados, resultando em uma desumanização e no apagamento de suas individualidades e subjetividades. Esses corpos são frequentemente percebidos e valorizados apenas pelo desejo sexual e pelas características estereotipadas de masculinidade e virilidade, promovendo uma visão limitada e preconceituosa.

 

Luze Silva, pesquisador e comunicador, participou de entrevista no programa Palavra Aberta, da TV Assembleia, nesta segunda-feira, 28. Ele aponta que a hipersexualização retira das pessoas negras a possibilidade de serem vistas em suas integralidades e particularidades. Com um histórico social marcado por objetificação e pela instrumentalização do corpo negro, essa problemática se reflete hoje no ambiente digital e em redes sociais, aplicativos de relacionamento e até mesmo em mídias como o cinema e a televisão. Esse contexto cria um ciclo nocivo, onde o corpo negro é confinado a um espaço de desejo, sem que se permita que ele exerça uma identidade completa e humana.

 

A matéria pode também explorar como a mídia tem contribuído para perpetuar esses estereótipos, e o papel fundamental de espaços de diálogo e da representatividade positiva para combater esse sistema de objetificação, abrindo caminhos para uma percepção mais inclusiva e humana.

 

Desafios e potenciais das mídias digitais na formação de crianças e adolescentes

 

Para Luze Silva, vivemos em uma era digital onde crianças e adolescentes estão inseridos desde cedo, consumindo conteúdos em plataformas como Instagram e TikTok, que têm a capacidade de influenciar a forma como se percebem e interagem com o mundo. O potencial formativo desses meios é inegável: são ambientes que proporcionam acesso a uma diversidade de informações e culturas. No entanto, é fundamental estar atento aos riscos envolvidos, principalmente a propagação de preconceitos e padrões que podem consolidar comportamentos inadequados ou até prejudiciais.

 

O Impacto dos conteúdos nocivos

 

De acordo com o pesquisador, as redes sociais estão repletas de conteúdos variados, e, infelizmente, isso inclui uma quantidade significativa de mensagens racistas, misóginas, gordofóbicas e transfóbicas, que moldam as percepções de jovens em desenvolvimento. O bombardeio constante de estereótipos pode cristalizar visões distorcidas e preconceituosas. Por exemplo, uma criança exposta repetidamente a conteúdos racistas ou homofóbicos pode internalizar esses valores, tornando-se mais propensa a reproduzi-los na vida adulta.

 

"Além disso, a efemeridade característica das redes digitais, onde se pode cancelar ou 'pular' conteúdos com facilidade, pode fomentar uma 'desresponsabilização' em relação às interações com o outro. A prática do cancelamento também reforça a sensação de impunidade, pois, ao bloquear ou excluir um perfil, elimina-se rapidamente qualquer responsabilidade sobre a interação", disse Luze Silva.

 

Somado a isso, o formato das mídias digitais – especialmente o consumo rápido e contínuo de vídeos curtos em formato vertical – tem impactado a capacidade de interpretação e atenção das crianças e adolescentes. Diversos estudos apontam que o processamento de informações se torna fragmentado, dificultando o desenvolvimento de habilidades críticas para filtrar e compreender o que consomem.

 

Letramento e empoderamento como caminhos

 

Luze Silva orienta que a resposta a esses desafios está no incentivo ao letramento digital, racial e social desde cedo, na família e na escola. Paa ele, o letramento digital, ao proporcionar ferramentas para que jovens interpretem criticamente as mensagens que recebem, prepara-os para um consumo consciente. "Esse processo, combinado com o empoderamento, especialmente para crianças e adolescentes de grupos historicamente marginalizados, é crucial para que esses jovens cresçam compreendendo seu valor e lugar na sociedade, mesmo frente às adversidades."

 

"O empoderamento vai além do discurso, ajudando cada indivíduo a se entender enquanto pessoa e a reivindicar seus direitos. Para crianças negras, por exemplo, é fundamental cultivar um espaço de acolhimento desde cedo para que cresçam sabendo que têm direito ao respeito e à dignidade, ajudando-os a resistir e desafiar padrões estigmatizantes."

 

Um caminho coletivo

 

No Palavra Aberta, Luze Silva disse que a construção de uma sociedade mais inclusiva e acolhedora para todos é uma luta coletiva que exige esforços de pessoas de todas as origens e identidades. "É preciso uma mudança de perspectiva, onde a sociedade como um todo entende que os privilégios existentes podem e devem ser redistribuídos para criar um espaço onde todas as pessoas tenham as mesmas oportunidades."

 

"O avanço depende, sobretudo, de uma base educacional sólida, pautada pelo respeito às diferenças e pelo incentivo ao pensamento crítico. A educação tem o papel de fornecer o arcabouço necessário para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, e o combate ao racismo, à misoginia e à transfobia precisa ser parte integrante desse processo."

 

E diante das barreiras impostas pela sociedade e amplificadas pelo ambiente digital, os esforços por uma sociedade mais igualitária precisam continuar, e a educação é a principal ferramenta para esse avanço, enfatiza Luze Silva. "A luta contra a desinformação e contra os estereótipos discriminatórios é contínua, mas o engajamento coletivo pode acelerar o processo. Assim, todos – crianças, adolescentes e adultos – podem se sentir parte de uma sociedade onde a diversidade é valorizada, e os preconceitos, superados."

 

Confira a entrevista completa


 

Fonte: TV Assembleia

Edição: Site TV Assembleia