Brasil lidera ranking de mortes de pessoas trans

por Antônio Luiz Moreira Bezerra publicado 29/01/2023 08h05, última modificação 27/01/2023 20h30
País está no topo da lista pelo 14º ano consecutivo

Deutsche WelleO Brasil segue liderando o ranking de países com mais mortes de pessoas trans e travestis no mundo, aponta o dossiê Assassinatos e Violências contra Travestis e Transexuais Brasileiras. É o 14º ano consecutivo em que o país está no topo da lista.


Os dados foram divulgados na quinta-feira (26/01) pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), em uma cerimônia no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

 

Para o ranking internacional, a Antra usa como base o projeto Trans Murder Monitoring (TMM), da rede Transgender Europe, que contabilizou 96 assassinatos de pessoas trans no Brasil entre outubro de 2021 e setembro de 2022. México e Estados Unidos aparecem em segundo e terceiro lugares, com 56 e 51 assassinatos, respectivamente.

 

Já segundo o levantamento da própria Antra, em 2022, 131 pessoas trans e travestis foram assassinadas no Brasil, e 20 tiraram a própria vida em decorrência da discriminação e do preconceito.

 

Para o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, os dados são uma "tragédia", mas representam uma oportunidade de mudança.

 

"O fato de termos um relatório como esse aponta para possibilidade de pensar superar essa tragédia. Ter o conhecimento, ter os dados, ter a possibilidade de olhar de frente para esse problema, nos traz perspectiva de mudança, de transformação", disse.

 

Perfil das vítimas

 

O perfil predominante entre as vítimas é de mulheres trans e travestis negras e pobres. Entre os assassinatos, 130 foram de mulheres trans e travestis e um de homem trans.

 

A pessoa mais jovem assassinada tinha 15 anos – quase 90% das vítimas tinham até 40 anos, e a idade média foi de 29,2 anos. A estimativa média de vida de pessoas trans no Brasil é de 35 anos, segundo a Antra.

 

Do total de pessoas assassinadas, 76% eram travestis ou mulheres trans negras. Ao menos 54% atuavam como profissionais do sexo – a prostituição é a fonte de renda mais frequente entre as vítimas.

 

Ao menos 65% dos assassinatos apresentaram requintes de crueldade, como o uso excessivo de violência.

 

Em números absolutos, Pernambuco foi o estado que mais registrou assassinatos (13), seguido por São Paulo (11), Ceará (11), Minas Gerais (9), Rio de Janeiro (8) e Amazonas (8).

 

O levantamento mostra que mulheres trans e travestis têm até 38 vezes mais chance de serem assassinadas em relação aos homens trans e às pessoas não binárias.

 

Suspeitos

 

Entre os 131 assassinatos do ano passado, foram identificados 32 suspeitos – a maioria não tinha relação direta, social ou afetiva com a vítima.

 

Segundo o dossiê, "é constante a ausência, precariedade e a fragilidade dos dados, muitas vezes intencionalmente, usados para ocultar ou manipular a ideia de uma diminuição dos casos em determinada região".

 

De acordo com a pesquisadora responsável e secretária de Articulação Política da Antra, Bruna Benevides, contribuem para esse quadro fatores como a ausência de ações de enfrentamento da violência contra pessoas LGBTQ.  A falta de dados e subnotificações governamentais também podem contribuir para um cenário impreciso ao longo dos anos, além de dificultar a identificação de acusados.

 

"Se pegar o telefone e pesquisar no Google ou qualquer outro mecanismo a palavra 'travesti', oito em cada 10 notícias são sobre violência, e esse cenário tem que mudar", afirmou.

 

Benevides também destacou que, desde 2019, com o governo de Jair Bolsonaro, houve exclusão de comitês e mecanismos de proteção e visibilidade da pauta pelos ministérios dos Direitos Humanos, da Educação e das Relações Exteriores. 

 

Desde 2017, quando iniciou a pesquisa, a Antra registrou um total de 912 assassinatos de pessoas trans e não binárias brasileiras. Em 2021, haviam sido 140 casos; em 2020, 175; em 2019, 124; em 2018, 163; e em 2017, o recorde 179 casos.

 

Reações do governo

 

A secretária nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, Symmy Larrat, primeira travesti a ocupar o cargo, prometeu "trabalhar com ousadia" na proteção às pessoas trans e travestis.

 

"Os dados que recebemos hoje [quinta-feira] vão reger a criação das nossas políticas públicas", enfatizou. 

 

A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, afirmou que, nos últimos anos, houve um processo político de negação da existência de pessoas negras e trans.

 

"Esses números são extremamente impactantes. Isso tem relação com a necropolítica e o quanto esses corpos são descartáveis", disse, ao se comprometer com o tema.  

 

le/lf (AgBR, ots)

 

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Fonte: Deutsche Welle

Imagem: Imago/ZumaPress/C. Faga

Edição: Site TV Assembleia