Estudo aponta que PrEP injetável pode gerar mais adesão entre jovens que a oral

por Antônio Luiz Moreira Bezerra publicado 17/04/2025 09h31, última modificação 17/04/2025 09h31
Os resultados são especialmente promissores para superar os desafios

O grupo de estudos ImPrEP CAB Brasil, uma realização da Fiocruz com o Ministério da Saúde, em colaboração com pesquisadores de outras instituições, ganhou destaque na 32ª Conferência sobre Retrovírus e Infecções Oportunistas (CROI) – um dos principais eventos científicos da área. O trabalho apresentado pelo grupo, em São Francisco, nos Estados Unidos, avaliou a cobertura de Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) oral diária e da PrEP injetável de longa duração entre jovens de populações mais afetadas pelo HIV no Brasil. Segundo os autores, a modalidade injetável de longa duração demonstrou melhorar de forma significativa a cobertura e, consequentemente, a proteção ao HIV.

 

Os resultados são especialmente promissores para superar os desafios de adesão enfrentados sobretudo por jovens e  populações vulnerabilizadas. Além disso, a assiduidade dos participantes nas consultas para aplicação das injeções foi alta e consistente, um dado importante para construção da estratégia de implementação dessa tecnologia no Sistema Único de Saúde (SUS).

 

O estudo incluiu 1.447 participantes – gays, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens (HSH) cisgênero, pessoas transgênero e não-binárias –, com idades entre 18 a 30 anos, que nunca haviam utilizado PrEP. Eles puderam escolher entre PrEP oral diária ou a injetável de longa duração e iniciaram o uso já na primeira visita do estudo. A pesquisa foi conduzida em seis cidades brasileiras (São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis, Salvador, Manaus e Campinas). A inclusão de participantes ocorreu entre outubro de 2023 e setembro de 2024, com um acompanhamento mínimo previsto de 48 semanas.

 

Para efeito de comparação, os pesquisadores formaram um grupo de comparação com 2.411 pessoas com características demográficas similares, que iniciaram a PrEP oral diária em unidades do SUS no mesmo período do estudo. A cobertura de PrEP foi medida pela proporção de dias em que os participantes estavam protegidos com a PrEP, seja oral ou injetável de longa duração.

 

Os resultados mostraram taxas de cobertura de 95% para quem usou PrEP injetável de longa duração e de 58% para quem optou pela PrEP oral diária, dentro do estudo ImPrEP CAB Brasil. No grupo de comparação a cobertura foi de 48% . As comparações pareadas de cobertura indicam diferenças significativas entre quem escolheu o esquema injetável de longa duração e os demais grupos.

 

A preferência pelo esquema injetável foi expressiva: 83% dos participantes optaram pela PrEP de longa duração com Cabotegravir. Entre eles, 94% receberam as injeções dentro do período correto e apenas 6% perderam o acompanhamento do estudo – sendo que apenas 0,8% realizaram apenas a primeira aplicação.

 

O protocolo do estudo permitia a troca de modalidade. Cerca de 9% dos participantes mudaram do esquema oral diário para o injetável, enquanto que 4% fizeram o caminho inverso. Durante o acompanhamento, foram registradas nove infecções por HIV entre participantes dos grupos de comparação que usaram a PrEP oral diária, e nenhuma soroconversão entre os usuários de PrEP injetável no ImPrEP CAB Brasil.

 

Segundo a infectologista Beatriz Grinsztejn, do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) e principal pesquisadora do ImPrEP CAB Brasil, “a importância do estudo é mostrar que a implementação do Cabotegravir injetável para pessoas de minorias sexuais e de gênero, inclusive as mais vulnerabilizadas, é viável e bastante efetiva. A cobertura foi muito alta em comparação à PrEP oral, o que é corroborado pelo fato de não termos registrado infecções pelo HIV entre as pessoas que usaram a PrEP injetável”.

 

Beatriz lembra que medicamentos de uso diário geralmente apresentam maior dificuldade de adesão, enquanto o Cabotegravir, aplicado a cada dois meses, proporciona uma cobertura muito melhor. Ela destaca ainda que a droga permanece no músculo, garantindo proteção por cerca de dois meses.

 

“Eventualmente se espera que a droga venha a ser incorporada ao SUS, beneficiando aqueles que têm mais dificuldade de adesão com a PrEP oral. A PrEP injetável de longa duração pode aumentar tanto o número quanto a diversidade de pessoas protegidas contra o HIV, contribuindo para a ampliação e o alcance da PrEP. Esse estudo traz subsídios importantes para o Ministério da Saúde avaliar a viabilidade da implementação”, afirma a pesquisadora. A apresentação foi muito bem recebida no CROI e o grupo foi convidado a participar da coletiva de imprensa do evento, reflexo da relevância e repercussão dos resultados.

 

PrEP


No campo das tecnologias de enfrentamento ao HIV/Aids, os medicamentos de longa duração vêm tendo um papel de destaque, tanto como novos tratamentos quanto como alternativas de prevenção. No caso da prevenção, oferecem novas opções para enfrentar o desafio da adesão diária exigida pela PrEP oral. Muitos usuários não conseguem manter a regularidade diária na ingestão de comprimidos, o que pode comprometer a eficácia da profilaxia.

 

O ImPrEP CAB Brasil é, até o momento, o maior estudo de implementação de PrEP de longa ação da América Latina, gerando evidências para subsidiar políticas públicas de saúde no Brasil e em outros países de contextos similares. Além do INI/Fiocruz, participam do estudo o Centro de Referência em Treinamento para IST/Aids, de São Paulo, o Centro de Referência em IST/Aids, de Campinas, a Fundação de Medicina Tropical Heitor Vieira Dourado, de Manaus, e a Universidade da Califórnia.

 

“A próxima etapa do ImPrEP será o estudo do Lenacapavir, outro medicamento injetável que trata e previne o HIV”, adianta Beatriz. “Será um estudo conduzido nos mesmos seis centros e em mais uma unidade em São Paulo. Avaliaremos o uso do Lenacapavir aplicado a cada seis meses como PrEP para minorias sexuais e gênero, desta vez abrangendo pessoas de 15 a 30 anos”.

 

CROI


Criada em 1993, a CROI se consolidou como um dos principais fóruns científicos sobre retrovírus e infecções oportunistas. A conferência reúne cientistas e pesquisadores clínicos para discutir avanços em epidemiologia, biologia e tratamentos de HIV/Aids, hepatites, Sars-CoV-2 (incluindo Covid longa) e mpox, promovendo a troca de conhecimento entre pesquisa básica e clínica e contribuindo para o desenvolvimento de novas estratégias de prevenção, diagnóstico e tratamento.


Fonte: Agência Fiocruz - Imagem: Fernando Frazão